quarta-feira, 6 de abril de 2011

Acerca do documento

 A partir do excerto de Umberto Eco, o simpático grupo de meninas elaborou uma interessante reflexão. Deixe-se envolver:

       Para começarmos a atividade sobre o excerto de “Baudolino”, pretendemos expor este e os pontos principais dos textos vistos na disciplina de EDP – Educação e Desenvolvimento de Projetos 5 – para que, só após, fechemos nossa interpretação sobre aquela.

“Se queres transformar-te num homem de letras, e quem sabe um dia escrever Histórias, deves também mentir, e inventar histórias, pois senão a tua História ficaria monótona. Mas terás que fazê-lo com moderação. O mundo condena os mentirosos que só sabem mentir, até mesmo sobre coisas mínimas, e premia os poetas que mentem apenas sobre coisas grandiosas”.
(Umberto Eco, Baudolino )

O primeiro texto a que tivemos acesso na Unidade Temática foi o de Leandro Karnal, “A memória evanescente”, capítulo inicial do livro O historiador e suas fontes, organizado por Carla Pinsky e Tania Regina de Luca. Neste encontramos um tema que já discutimos anteriormente em outros momentos do curso: a questão das fontes. Tal tema fez com que recordássemos do ensaio que fizemos no segundo período do curso – no qual, por meio dos textos que tivemos acesso durante o semestre, tivemos que estruturar uma obra particular, baseada nos textos estudados. Assim, nossa interpretação se misturaria e se basearia nas outras já presentes nestes textos – mas sem um “toque” pretencioso ou inventivo. Esse “toque” fez com que a estruturação e trato com as fontes fosse único e ímpar para a nossa construção enquanto historiadores. Soubemos os limites e as várias informações que pode-se retirar de um texto sem ao menos substituí-lo por outra fonte/viés. O “ver as entrelinhas” e o como a fonte pode despertar inúmeros olhares – mas os “bons olhares”, que sabem como a inferir/retirar uma construção fortificante – foram pois um dos primeiros contatos e ensinamentos que tivemos com à analise de fontes.                  
     O texto citado acima reforça a experiência que tivemos e trata/quer mostrar exatamente a complexidade das fontes. Relata que, no começo, somente material escrito – como cartas, escrituras, etc – eram considerados “verdadeiros documentos” e pois “verdadeiro material para passível construção de uma história”.
Já com o surgimento dos Annales e o estudo da micro-história, “documento” passa a ter outra interpretação/uso, passando a ser tudo o que retrata a ação do homem – como arte, oralidade etc. Isso equivale, pois, a dizer que houve uma ampliação de objetos e de sujeitos que agora são suscitados e trazidos à tona, desconstruindo certas formulações instituídas – politicamente, inclusive – e que modulam novos vieses de interpretação de uma mesma temática.
É em cima de tal questão/com base nisso é que o autor vai tratar da questão da “veracidade” das fontes. Se tudo o que era documento era verídico, porque então construir uma “nova história” em cima dos documentos? E agora, com a ampliação de fontes, tudo também é verídico ou atende a perspectivas da História? Como valer-se de um “verdadeiro” fato histórico ou de um “simples” fato? Vale, pois delinearmos isto melhor.
O autor ressalta e questiona no texto a questão da falsificação dos documentos ao longo de todo história. Os Faraós – no Egito antigo – já falsificavam documentos e tal “prática/hábito” se prolongou até o nosso presente – o que nos ilustra bem o “perigo” de se prolongar a questão de “documento” como obra puramente verídica. Juntando a esta ideia e passagem, há outro episódio interessante que relata a falsificação dos “diários de Hitler”. Neste presente episódio, os falsários não tiveram muita sorte e acabaram presos.
O que fazer nesta circunstancias? Como agir?
Até hoje persiste uma busca incessante pela autenticidade/verossimilhança dos documentos. Desta maneira, a ideia central de tal texto nos ilustra não somente o difícil trato do historiador com a sua fonte, mas, também, que os documentos são construções “humanas” e que, portanto, atendem aos mais diversos anseios e circunstâncias. Para isso, o historiador que aventura-se pelas construções e pesquisas que lhe interessem – demonstrando aí que o historiador apesar de ser um sujeito nem tão “não-determinista” assim, já que mostra seu anseio de optar em um tema e não em outro – deve tomar cuidado.
A fonte está dada, mas a construção desta deve passar pelos seus instrumentos adquiridos na qualificação de graduação, etc – que são o suporte que somente este tem para construir algo “fortificante” à História em geral. Portanto, o “construir uma história” é saber que ela está/é passível de desconstrução. E que o documento histórico – como o autor, Leandro Karnal, define – é “em, síntese, (...) qualquer fonte sobre o passado, conservado por acidente ou deliberadamente, analisado a partir do presente e estabelecendo diálogos entre subjetividade atual e subjetividade pretérita”. (KARNAL, 2009)

       Já no segundo texto que estudamos, intitulado “Aventuras modernas e desventuras pós-modernas” de Elias Tomé Saliba – presente no mesmo livro –, este dá continuidade a discussão em torno das fontes. Relata uma questão de uma história mais presente, como a do holocausto, ocorrido na Segunda Guerra Mundial; a então denominada “história dos mortos-vivos”. Explica-se que em tal ocasião, a denominação advém da história relatada por pessoas que viveram certos momentos históricos e que, porém, não compartilham (e se compartilham, compartilham pouco) da história em que viveram/acumularam com seus descendentes/antepassados. Desta maneira, existe uma grande preocupação pelos historiadores para que tal história não seja esquecida ou distorcida após a morte da ultima testemunha de determinado momento histórico.
Ao passo que existe esta preocupação, também há outra questão em que o autor também observa/coloca em questão: que há uma busca exagerada pela verdade absoluta da história pelos historiadores.
Sob a égide destas questões, porém, o autor tem uma conclusão que traz um ponto de vista muito interessante: que a construção da historia é uma questão de escolha, ou seja, os documentos não existem de formas isoladas – eles não são restos do passado, mais um produto dele. Os “pontos de vista”, “o que” preservar e o “como” preservar, serão ditados às necessidades pela qual a estrutura cotidiana do historiador o exercita/suscita ou a necessidade de construção/desmistificação da qual a temática o apreende. O documento não vai dizer o que representa: cabe aos historiadores determinarem o significado destes – e que portanto/a partir disso, cada um terá um ponto de vista distinto/interpretação distinta do outro.
Segundo o autor – e reforçando; contudo encerrando este segundo texto – “o documento escrito ou não escrito é um pequenino ponto de toda série de estruturas humanas desaparecidas que, por capricho, fruição, contingência – e até mesmo algumas excentricidades – acabaram por sobrar e subsistir no presente”. (SALIBA, 2009)

            Com base nas duas exposições de textos vistos e o excerto de Baudolino, acreditamos ser de mais fácil visualização a proposta de tal atividade. Por Baudolino, apreendemos que parece ser mais “fácil” mentir para adquirir popularidade em um primeiro momento que simplesmente ser verdadeiro. Porém, como o mesmo fala, a mentira esvai se não ser bem contada ou se não ser direcionada de alguém que transparece “ser verdadeiro”. Mesmo assim, qualquer poeta (e aí, aquele que escreve sem o instrumental comparável do historiador) que retrate tal circunstancia, muitas vezes ganha o “reconhecimento” por tal feito ou por ter “dado o valor” à fonte de algum dado momento.
            Fica, nas entrelinhas portanto que qualquer um pode escrever qualquer história –  se não se tem um “filtro” de todas as coisas que chegam; uma construção do subjetivo que pode interferir no real, dependendo das circunstancias. Porém, “qualquer” história não pode ser aceita numa pesquisa/delineação/desmistificação de um historiador. Portanto, quando se exalta a qualidade de discussão de textos sobre fonte, é justamente o que o historiador deve ater-ser/voltar seu olhar quando pautar-se a escrever uma tese/temática delineada.
            O historiador aí distingue-se da faculdade de outros escritores justamente por ter o cabedal instrutivo de “como lidar” com as fontes e “como ater-se” à alguns parâmetros – sem querer pois um dado “reconhecimento” ou outra coisa que não seja apenas o “fato bem construído”. O determinismo – no que se refere a temática – deve tentar ser o menor e que, portanto, a verossimilhança dos fatos e estruturas sejam os seus objetivos sobre um dado momento histórico. Saber que sua construção – repetindo o que dissemos anteriormente – é passível de desconstrução com as novas fontes surgindo a todo o momento é que deve aliar/ajudar o pesquisador a entender a sua área e sua atuação enquanto profissional.
            Uma mentira formulada e repetida não deve ser o cabedal de instrução de um historiador e, evidenciando com a discussão do segundo texto, a “verdade incontestável” só deve ser chegada após a transformação de determinado fato em um verdadeiro – e portanto desmistificado – fato histórico – lembrando que este, como já disse, é (re)construído.
Ao passo que uma construção é desmistificada, não se pode desconsiderá-la também por inteiro: buscar suas causas de construção e servir de referencial deveras fortificante se deve apenas no “como” o historiador sabe manejar suas fontes. Portanto, nem toda mentira deve ser desconsiderada (como Baudolino de certa forma afirma), mas sim como ela é manejada/trabalhada/interpretada pelos historiadores que com seu cabedal oferece informações construtivas.

Autoras: Kamilla, Karine e Marcela.

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